domingo, 5 de maio de 2024

Geira e Arrieiros

 


O Caminho de da Geira e  Arrieiros é conhecido como o percurso jacobino hispano-português que começa na cidade de Braga e termina em Santiago de Compostela, num percurso de aproximadamente 250 quilómetros por trilhos de montanha, em subidas e descidas contínuas que acumula no seu final cerca de 6.300 metros de subida.

Esta denominação foi escolhida em função das suas origens históricas, uma vez que a primeira parte do percurso corresponde à Via Romana (Geira) XVIII, que ligava Braga (Bracara Augusta) a Astorga (Asturica Augusta), para depois continuar pelo caminho dos Arrieiros, que os Romanos e "Arrieros" usavam para ir a Ribadavia e a Santiago de Compostela.

Pensa-se que depois os peregrinos começaram a usa-las para chegarem a Santiago de Compostela. 

 O Caminho da Geira e dos Arrieiros coincide em muitos troços com o emergente Camiño Miñoto Ribeiro e faz parte do Transfronteiriço, realizado com financiamento europeu, existindo evidência não só da via romana Vía XVIII, mas também oito igrejas de Santiago, quatro das quais na zona de O Ribeiro, alguns vestígios de sete hospitais para peregrinos e seis termas utilizadas pelos peregrinos em tempos remotos.

O Caminho de da Geira e dos Arrieiros é um percurso de grande beleza, com traçado complicado e pouca sinalização (recomenda-se GPS), cheio de história e tradição jacobeia.

A sinalização e os serviços do Caminho, são actualmente escassos e algo deficientes, com muitas marcações contraditórias e confusas por causa de ainda estar em processo de oficialização e alguns Presidentes de Câmara e Alcaides tentarem desviar o caminho para os seus Municípios. 

Para mim a Aventura começou de comboio na a Agualva, para depois se juntarem em Santa Apolónia os grandes amigos Fernando e Pedro, numa viagem até Braga, onde chegamos por volta das 14 horas. Depois de uma pequena visita à Sé e arredores, posemo-nos logo a caminho. A saída da cidade é em ambiente semi-urbano, embora bonito e agradável. Para depois entramos em  Caldelas, uma pacata cidade termal que parece ter visto dias melhores, mas mantém o charme decadente de tempos passados. Dai começamos um percurso, difícil e difícil... mas incrivelmente lindo. Deixamos Caldelas para trás por ruas íngremes de paralelepípedos, até chegarmos a Parahos, onde saímos por uma estrada. Percorremos alguns quilómetros por essa mesma estrada até chegarmos à vila de Santa Cruz, onde continuamos por um caminho de terra batida com indicação clara da Geira e encontramos os primeiros marcos miliários das estradas romanas que nos acompanharão durante vários dias. Mais adiante chegamos à bifurcação que o Caminho Oficial recomenda, que desce até Terras de Bouro, Acabamos o dia com cerca de 32 quilómetros e 850 metros de acumulada. A noite foi passada numa espécie de esplanada mesmo perto do rio.






















No segundo dia saímos de Terras de Bouro até Lobios num total de 35 quilómetros e uma acumulada de 1.270 metros.  
Optámos por seguir a Geira original, num percurso espectacular que segue uma curva de nível a uma altitude de 450 metros, mas de uma dificuldade imensa para quem viaja com as bicicletas carregadas com tudo o material necessário para viajar em autonomia. Chegamos a Covide completamente estafados. Dai foi subir até à Portela do Homem, sem dúvida um percurso magnífico: muita vegetação, rios, cascatas e vestígios romanos, mas também um percurso árduo com declives significativos. Depois de passar o parque de campismo do Parque Cerdeira, à direita encontra-se uma estrada alcatroada que rapidamente se transforma em terra batida. Percorremos esse estradão com excelentes vistas sobre a  Albufeira de Vilarinho das Furnas formada pelo Rio Homem até chegarmos a uma bonita zona com cascata e várias pontes. Depois veio a descida vertiginosa até Lobios, onde Pernoitamos num local idílico. Poucos sabem que Lobios esconde uma estância termal gratuita, com uma piscina exterior onde a temperatura da água varia entre os 35 e os 45 graus. Também conhecidas como Baños de Rio Caldo, as termas de Lobios ficam na pequena aldeia de Los Baños, na província de Ourense, apenas nove quilómetros da fronteira portuguesa no Gerês. A água sai da nascente a uma temperatura de 70 graus, mas após misturar-se com a água fria do rio, desce para uns suportáveis e agradáveis 45. No Verão, com o calor, pode tornar-se insuportável, mas nos meses frios é realmente convidativo ficar algumas horas dentro da piscina que ali foi construída e foi isso exactamente o que fizemos. 





































O terceiro dia foi o mais duro com 71 quilómetros e 1792 metros de acumulada. Partindo de Lobios, entrando em Portugal até Castro Laboreiro, a 1.019 metros de altitude e saindo novamente para Espanha até Ribadavia.

Saímos de Baños cm destino a Lobios num percurso curto de cerca de 5 quilómetros, onde parámos para o pequeno almoço e abastecimentos para o resto do dia. Como já estávamos fartos das marcações confusas e percursos pouco cicláveis para nós, decidimos estudar o percurso e arranjar algumas alternativas daquilo que nos pareceu poder arranjar-nos problemas e perca de tempo.

Seguimos pelo caminho oficial até Entrimo, para depois optarmos por uma alternativa mais segura até Ameijoeira, já em Portugal, numa subida contínua com cerca de 30 quilómetros por caminhos de montanha e florestas até Castro Laboreiro, onde paramos para o merecido descanso e abastecimento. 

Em conversa com alguns locais ficamos a saber que a descida para Trado, já em Espanha era perigosa com declives muito acentuados até para aqueles que faziam o caminho a pé e então, mais uma vez arranjamos uma alternativa ciclável para descermos em segurança. Foram 30 quilómetros a descer, por estradas e caminhos rurais, com a particularidade de termos atravessado a fronteira sem darmos por isso. No final da descida, quando olhamos para os discos de travão estavam azuis por causa do sobreaquecimento. 

Finalmente, um percurso, fácil e lindo!!!! Monte, bosques de cor excepcional, aldeias e a presença do rio Minho, como protagonistas. Entramos em Ribadavia pela estrada e seguimos pela beira do rio até um parque urbano onde pernoitamos.














 
Ao quarto dia e já com a companhia do grande amigo Galego Miky, decidimos alterar por completo a etapa, porque o Miky conhecendo a zona disse nos que a etapa era pouco ciclável. Acabamos por fazer um percurso lateral aos caminhos dos arreiros mais pelo interior, percorrendo uma boa parte do caminho Minhoto Ribeiro . Percurso feito por estradas rurais com paisagens magnificas de vinhedo e bosque de carvalhos a perder de vista. Foi dos bosques de carvalhos mais bonitos que vi até hoje.

Voltamos ao caminho oficial em Beariz, saindo logo de seguida para Lebozan, Portela de lamas e acabarmos em Soutelo do Monte. Onde pernoitamos à entrada do pavilhão gimnodesportivo, porque nesse dia estava a chover copiosamente e um frio de rachar. Ainda tentamos ficar numa residencial local, mas pediram-nos um preço exorbitante por uma noite. Preço esse que deu para a conversa do resto da noite, sendo a opinião do Miky que com as confusões e interesses dos Alcaides e a tentativa de exploração dos comerciantes, este caminho ade morrer antes de nascer.










No ultimo dia e como já tínhamos saído do caminho varias vezes, decidimos experimentar uma forma de orientação diferente. Através do Google Maps, escolhendo a opção bicicleta e ficamos surpreendidos porque o programa escolhe estradas de terra e pavimentadas com pouco ou mesmo nenhum trafego e normalmente utilizadas só por agricultores. Também elas muito bonitas e com paisagens brutais. Acabamos por confluir com o caminho de prata em Susana e foi por ai que entramos em Santiago de Compostela, Com 57 quilometros e 960 metros de acumulada.


















Depois da chegada à Praça Obradoiro, das emoções da chegada, de uma visita à Catedral e de mais umas pequenas actividades e visitas, chega a hora satírica de sair de Santiago. Tínhamos visto que tínhamos um comboio para Vigo ás 18.30 horas, com chegada ás cerca das 19.25 horas a Vigo e outro de Vigo para o Porto às 19.56 horas e com chegada ao Porto por volta das 21.18 horas, tendo no porto um comboio para Lisboa às 1.30 horas com chega a Lisboa às 6.30 da manhã.

Pois isto era bom de mais para a quantidade de pessoas que querem sair de Santigo e o resultado foi ter que apanhar o próximo comboio disponível para Vigo às 20.30 horas com chegada a Vigo às 22 horas, para depois só termos comboio para o Porto no outro dia às 9 horas da manhã com a agravante de só levarem duas bicicletas montadas, tendo que desmontar e empacotar uma. O resultado disto foi ter que pernoitar em Vigo dentro de um estacionamento coberto num canto onde não nos vicem. 

Mas são estas coisas que dão mais adrenalina e emoção a estas aventuras, é a camaradagem, a amizade e mesmo a discórdia saudável que fazem os momentos intensos serem ainda mais marcantes, é isto que nos faz ser companheiros e amigos de viagem com memorias para o resto da vida. A eles o meu eterno agradecimento e a cada um deles em particular o meu bem haja. Ao Pedro pela serenidade e bom senso. Ao Miky pela disponibilidade e um grande cicerone da sua terra. Ao Fernando pela alegria e intensidade de cada momento.