sexta-feira, 10 de junho de 2016

De casa a Santiago de Compostela


Desde a primeira vez que fiz os caminhos de Santiago, fiquei logo com esta ideia de um dia ligar a minha casa a Santiago de Compostela, passando pelo Santuário de Fátima de bicicleta e em autonomia.

Esta talvez tenha sido até ao momento a minha maior aventura, a peregrinação de uma vida e apesar de lhe chamar peregrinação, não quer dizer que o objectivo fosse o comprimento de alguma promessa. Foi o misto de muitas coisas, desde a aventura, a superação dos medos, a mística de sair de casa e ligar dois grandes Santuários, percorrendo vários quilómetros pelos meus próprios meios. O conhecer melhor o meu Portugal, porque considero que a melhor maneira de se conhecer um Pais ou uma região é de bicicleta. Permite nos percorrer grandes distâncias passando por locais remotos e em contacto directo com a natureza. Mas também em peregrinação. O caminho da peregrinação é, já por si, um universo com facetas religiosas, místicas, turísticas e físicas entre outras e cada peregrino vive-o de forma especial. O peregrino leva um destino na mente e um propósito no coração. Durante a jornada há, normalmente, um sentimento de discernimento de si e do mundo, e uma maior abertura e entendimento espiritual, aquilo que nos alimenta a alma. Despoletado pelo tempo de introspecção, pelo contacto com natureza, com novas realidades das terras e gentes com quem nos cruzamos. 


Saí de casa no dia 20 de Maio na companhia de dois amigos, o João e o Carlos, juntando-se mais tarde e já no Porto o Vitor e o Filipe.
O objectivo desse dia foi Santarém, numa etapa de cerca de 120 quilómetros. A maior de todo o caminho. Planeia assim por ter pouca acumulada em subida e também para avançar um pouco mais em quanto ainda estávamos frescos, tendo a possibilidade de mais tarde fazer etapas mais curtas se o cansaço se acumulasse.
Neste dia saímos da Agualva directos a Barcarena pela fabrica da pólvora até Caxias, apanhando o percurso ribeirinho até chegarmos à Sé de Lisboa onde fizemos a primeira paragem para carimbar as credencias. Depois foi rolar até Sacavém onde entramos nos caminhos de Fátima até Santarém.
A dificuldade deste dia foi a elevada quilometragem e o calor que se fez sentir o dia todo. 

A Maquina preparada
        
A partida à porta de casa 

Padrão dos descobrimentos
Ponte 25 de Abril
Praça do comercio
Sé de Lisboa
Ponte Vasco da Gama
Sacavém inicio dos caminhos de Fátima


Passadiço da Povoa de Santa Iria 
Ecovia de Alverca
Alhandra
Rio Tejo
Vila Franca de Xira 
Ponte José Carmona 
Central térmica 
Lezíria de Santarém 
A primavera em todo o seu esplendor  
Reguengos do Alviela 

O dia ia quente 
Santarém à vista 
Santarém depois de jantar 
No segundo dia partimos da Santa casa da Misericórdia, onde pernoitámos em instalações remodeladas e agradáveis. A realçar a simpatia do recepcionista.
Neste dia fizemos Santarém - Fátima, num total de 65 quilómetros mas com uma acumulada de 1.185 metros, um dia cansativo, pois tivemos que subir a serra de Aires e Candeeiros duas vezes.
Saímos de Santarém em direcção a São Salvador pelos caminhos de Fátima, passando pela Azoia, Santos, Milhariças, Amiais, onde parámos para o pequeno almoço. Monsanto, Covão do feto, Minde e aqui almoçámos no restaurante "Vedor´s" que sugiro a quem passar por Minde. Boa comida e atendimento do melhor.
Daqui seguimos para Fátima com a barriguinha cheio e a serra para subir. Não foi fácil, mas com vontade lá chegamos a Fátima um bocado acabados.

Saída de Santarém 

A caminho de São salvador
Advagar
Chã de Cima
Amiais ( pequeno Almoço)
Casais da Murela

Serra de Santo António 
Vista da Serra de Santo António 



Panorama para o vale de Minde

Minde

Restaurante Vedor´s



A subir a serra de Aires
A chegar a Fátima
Chegada a Fátima e o primeiro objectivo comprido
Basílica de Fátima

Ao terceiro dia, fizemos Fátima - Rabaçal num total de 73 quilómetros e 1.210 metros de acumulada, o que se veio a revelar uma etapa mais difícil do que estávamos à espera.
Neste dia aconteceu o primeiro percalço. O porta cargas do Carlos partiu num dos tantos trilhos isolados por onde passam os caminhos.Tivemos que inventar uma maneira de prendê-lo até chegármos a algum lugar onde fosse possível repará-lo. O Problema foi ser domingo e estar tudo fechado, mas o caminho tem destas coisas. Quando parámos para almoçar apareceu-nos um anjo que nos arranjou dois parafusos para nos desenrascar. Esse anjo foi o próprio dono do restaurante "O Regional" em Arneiro, que deixou de atender os clientes para ir à procura dos parafusos, mas entretanto serviu-nos umas bifanas divinais. Restaurante que recomendo vivamente, não só pelo atendimento, mas também pelas belas bifanas e todo o resto gastronómico muito bom, segundo os clientes que estavam presentes.  
Saímos de Fátima do hostel Califórnia onde pagámos a dormida mais cara de todo o caminho, em direcção a Caixarias e depois a Ansião, onde foi o único lugar que encontrámos os caminhos mal sinalizados e por percursos desnecessários e mal escolhidos. No entanto o percurso revelou-se muito bonito com partes ao lado do rio Nabão que nos proporcionou umas paisagens de cortar a respiração até muito perto do Rabaçal.

Saída de Fátima
A caminho de Arneiro
Aqui tivemos que infringir a lei 
Danou-se 
Caso resolvido para uns quilómetros 

Um grande bem haja a este homem
A Atravessar o Rio Nabão
Percurso junto ao Rio Nabão

Ansião

A caminho do Rabaçal

No quarto dia tinha previsto uma etapa do Rabaçal a Águeda, mas como estávamos com tempo, decidimos reduzi-la até à Mealhada, fazendo 56 quilómetros com apenas 637 metros de acumulada.
Estávamos a precisar de recuperar dos primeiros dias mais duros. 
Esta etapa não teve paisagens tão bonitas como a anterior, mas também ela foi muito agradável, com momentos pontuais de paisagens muito bonitas, como as ruínas de Conimbriga, a passagem por Coimbra e um percurso junta a uma ribeira no Zambujal. Claro que um dos pontos altos do dia foi o belo do jantar de leitão à Bairrada.    

 
Vista do albergue, também ele muito bom
  
Rabaçal pela manhã 
Percurso junto à ribeira do Zambujal

Conimbriga
Marcação do caminho 
Coimbra 
adega do leite

O belo do leitão
Mealhada
No quinto dia foram mais 56 quilómetros entre Mealhada e Oliveira de Azeméis e com 706 metros de acumulada, mais um dia para recuperar mais um pouco.
De assinalar a chuva e a única queda de toda a viagem. 
Os caminhos levaram-nos da Mealhada a Alpalhão num troço lamacento devido à chuva, continuando para Águeda, Campilho, Pinheiro da Bemposta onde almoçámos espantosamente barato no restaurante "Papo cheio" e finalmente Oliveira de Azeméis, onde pernoitámos nos Bombeiros, com poucas condições, mas com muita boa vontade por parte destes. Sendo o mais caricato o facto de ser dia de treino da fanfarra dos bombeiros e por volta das 22 horas, quando já nós estávamos deitados eles começaram a tocar e a sensação que o dormitório vinha a baixo durar até por volta das 23.30 horas.  

Saída do albergue da Mealhada
Uma capela muito engraçada
Casa senhorial 
Gosto
Lama, muita lama
Esqueci-me das rodinhas 
Tudo bem, siga !!
Hora de almoço

Águeda 
Águeda
aqui está uma boa protecção para a chuva 
Campelinho 
Campelinho

Bemposta 

Bemposta 
Perto de Oliveira de Azeméis 
Perto de Oliveira de Azeméis 
Oliveira de Azeméis 
Bombeiros 
Igreja de Oliveira de Azeméis 
 No sexto dia, foi dia de cumprir o segundo objectivo da viagem e chegar à bela cidade do Porto, onde se juntaram a nós o Filipe e o Vitor, no albergue do grande amigo Abel o"Refugio Via Portucales". Abel um homem que vive o caminho como poucos e que sustenta um albergue para peregrinos apenas dos donativos que cada peregrino deixa. Um bem haja por tudo.
Logo pela manhã saímos dos Bombeiros de Oliveira de Azeméis em direcção a São João da Madeira, passando por Cucujães, Arrifana e Grijó, onde fizemos uma paragem obrigatória para apreciar o belo Convento de Grijó. Saímos em direcção à serra de Negrelos, local magnifico e com paisagens brutais. De salientar um percurso em estrada Romana, difícil por ser a subir e com um declive acentuado, mas de rara beleza. 
Como a etapa foi curta de 46 quilómetros, Chegámos cedo a Vila Nova de Gaia, onde ficámos algum tempo a apreciar a paisagem para a outra margem do Douro e a Brutal Ponte de D.Maria aproveitámos e almoçámos a tradicional "Francesinha" na Ribeira sem antes termos passado pela Sé.
Depois de almoço e porque a preguiça tinha se apudorado de nós, decidimos subir até à Torre dos Clérigos a empurrar as bicicletas e apreciar com mais calma a maravilhosa cidade do Porto.
Finalmente chegamos ao albergue por volta das 17 horas, onde já estava o Abel de braços abertos à nossa espera. Aproveitámos para lavar a roupa e fazer pequenos arranjos no equipamento que começava a mostrar sintomas de desgaste. Tive que fazer uma operação cirúrgica aos meus alforges, porque com o peso começaram a rasgar. Isto até chegar o Vitor e o Filipe, momento que aproveitámos para ir jantar na companhia do Abel a um restaurante ali perto do Sr. Gil, que serve umas "Francesinhas" e uma sangria tão boa que a receita deve ter sido dada ao Sr. Gil pelo Deus Baco. Acabámos a noite no albergue em amena cavaqueira com a ajuda da sangria. 

Saída dos bombeiros de Oliveira de Azeméis
Marcações
Canastro típico da zona da Bairrada 
Cruzeiro 
Arrifana
Mosteiro de Grijo

Mosteiro de Grijo
  
Calçada Romana na Serra de Negrelos
Vila Nova De Gaia
Ponte D. Maria
Porto

Sé do Porto

 
Ruelas do Porto

A Francesinha na Ribeira
   
Estação de São Bento
Torre dos Clérigos 
Refugio Via Portucales
Operação cirúrgica aos alforjes  

No dia seguinte e já com um grupo de cinco, saímos do Porto em direcção a Tamel numa etapa de 61 quilómetros com 948 metros de acumulada. 
Esta parte do caminho e até Santiago de Compostela, eu já a conhecia, porque a tinha feito há alguns anos, mas nem por isso saí do albergue com menos entusiasmo dos que iam fazê-lo pela primeira vez, as emoções estavam ao rubro e com muita vontade de desfrutarmos de todo o que o caminho nos pode oferecer. 
A etapa levou-nos do Porto, passando pela Maia onde se encontra a ponte Romana sobre o rio Ave de uma beleza indescritível, Rates a primeira localidade a seguir ao Porto com albergue para aqueles que fazem o caminho a pé. Aqui tivemos a sorte de encontrar as festas da Vila com as ruas enfeitadas de uma maneira soberba. Depois a cidade de Barcelos, cidade que eu pessoalmente gosto muito e finalmente Tamel.
Toda esta etapa oferece-nos paisagens muitos bonitas com o verde como cor predominante que só se encontram por estas bandas.

Saída do Porto
Ponte Romana sobre o Rio Ave
Panorama da ponte
 
A caminho de Rates
Rates e as ruas decoradas 
Albergue de rates
Almoço na Pedra Furada

A caminho de Barcelos


Barcelos
Imagem tradicional do Minho

Ao oitavo dia saímos da casa Recoleta em  Tamel, para mim um dos melhores albergues do caminho,  até Valença num total de 62 quilómetros mas com uma acumulada de 1.113 metros devido à mítica subida da serra da Labruja, o terror de um bicigrino. Existe momentos que nos dá a sensação de estar a fazer escalada com a bicicleta, a dificuldade de progressão é tanta que em determinadas alturas tem que ser duas pessoas a empurrar uma bicicleta. 
Esta etapa é das mais duras de todo o caminho, mas também das mais bonitas, não estivéssemos nós a atravessar o verde Minho. Quando chegámos a Valença estávamos estoirados mas de alma cheia por todo o que tínhamos vivido e experienciado  neste dia.
Dia que nos levou de Tamel à bonita cidade de Ponte de Lima, Labruja, Rubiães, onde depois da descida da Labruja almoçámos. Atravessámos o Rio Coura na bela ponte Romana e acabámos cerca de 20 quilómetros depois em Valença. 

Saída da Casa recoleta ( Tamel)
  
Calçada Romana
Ponte Romana
Água cristalina 
Os primos

A caminho de Ponte de Lima

Ainda há quem lave roupa no rio
Ponte de Lima
Tanta coisa só para tirar uma foto
Cuidado podes cair
Um pequeno paraíso 
A mítica serra da Labruja 
Cruz dos Franceses
A caminho do Rio Coura
A primeira seta no caminho português
A caminho de Valença

Mais um banhinho refrescante 
A lavar a roupinha 
No nono dia e depois de uma noite de trovoada forte, acordámos com um dia cinzento e ameaçar chuva que veio a cair com alguma intensidade durante o dia. Fizemos uma etapa de Valença a Pontevedra com 65 quilómetros e 950 metros de acumulada. 
Esta etapa teve a particularidade de atravessarmos a Ponte Rodo-Ferroviária de Valença, também conhecida por Ponte de Valença ou Ponte Internacional de Tui, é uma infraestrutura rodo-ferroviária do ramal internacional que cruza o rio Minho, na fronteira entre Portugal e Espanha, é um marco no caminho e um momento que fica na memória por todo o simbolismo que representa passarmos de um País para o outro. Foi uma etapa em que começamos a subir a Galiza passando pelas cidades de Tui, Porriño, Redondela e sobretudo por bosque incrivelmente bonitos. De salientar os Canastros e cruzeiros desta região que são de uma magnifica arquitectura e beleza. 

Saída de Valença
Valença
Fortificação de Valença
Ponte de Valença
Fronteira 
Catedral de Tui
Tui
Os primeiros troços nos bosques Galegos
Já não falta tudo
Porriño
A caminho de Redondela
Os canastros e cruzeiros da Galegos 
Ria de Vigo
Ponte de Redondela
Redondela



Albergue de Pontevedra

Jantar em Pontevedra
Décimo e ultimo dia, com 68 quilómetros e 920 metros de acumulada, um dia que não sendo difícil, também não foi dos mais fáceis e só se faz melhor porque sabemos que estamos a chegar ao fim e a vontade é tão grande de lá chegar que nem nos apercebemos das dificuldades.
Neste dia o Carlos teve que voltar para casa em Padron por motivos laborais. É o que se chama morrer na praia dado que Padron fica a cerca de 25 quilómetros de Santiago de Compostela.
Nesta etapa saímos de Pontevedra, uma cidade que também considero muito bonita e com a emoção do ultimo dia até nos esquecemos da foto de praxe à saída do albergue. Passando depois por Caldas de Reis, Padron, a terra dos famosos pimentos e finalmente Santiago de Compostela.



Pontevedra
Ponte de Pontevedra


Entre Pontevedra e Caldas de Reis

Catedral de Padron


Padron





Bosques entre Padron e Santiago






Entre Padron e Santiago

Já nas ruas de Santiago



Depois de cerca de 700 quilómetros de bicicleta e 10 dias em autonomia a chegada a Santiago de Compostela e mais exactamente à Praça Obradoiro é um turbilhão de emoções. Se por um lado chegámos ao nosso objectivo e sentimos uma profunda sensação de conquista, porque saímos da zona de conforto e superámos aquilo que à partida nos parecia difícil, por outro sentimos que acabou aquilo que não queremos que acabe. Os momentos intensos com os amigos de viagem, o estar desligado do mundo e das rotinas, a partilha de experiências, o contacto com a natureza, povos e culturas, deixa em nós uma emoção de tristeza por tudo estar acabar.
Estas aventuras em que temos tempo para a  introspecção de nós mesmos e do mundo que nos rodeia, muda-nos e quando mudamos o mundo à nossa volta muda também.

Não foi a primeira vez que cheguei à Praça Obradoiro depois de uma peregrinação e garantidamente, esta também não será a ultima. Na verdade o fim desta é o momento exacto do começo da próxima.





  








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